Os espanhóis, com seus cavalos, suas espadas e lanças começaram a praticar crueldades estranhas; entravam nas vilas, burgos e aldeias, não poupando nem as crianças e os homens velhos, nem as mulheres grávidas e parturientes e lhes abriam o ventre e as abriam em pedaços como se estivessem golpeando cordeiros fechados em seu redil. Faziam apostas sobre quem, de um só golpe de espada, fenderia e abriria um homem pela metade, ou quem, mais habilmente e mais destramente de um só golpe lhe cortaria a cabeça, ou ainda sobre quem abriria melhor as entranhas de um homem de um só golpe. Arrancavam os filhos dos seios das mães e lhes esfregavam a cabeça contra os rochedos enquanto que outros os lançavam a água dos córregos rindo e caçoando, e quando estava na água gritavam: MOVE-TE CORPO DE TAL? Outros mais furiosos passavam mães e filhos a fio de espada. Faziam certas forcas longas e baixas, de modo que os pés tocavam quase a terra, um para cada treze, em honra e reverencia de nosso senhor e de seus doze apóstolos e deitando-lhes fogo queimavam vivos todos os que ali estavam presos. Outros a quem quiseram deixar vivos, cortaram-lhe as duas mãos e assim os deixavam; dessa maneira procediam comumente com os nobres e os senhores; faziam certos gradis sobre garfos com um pequeno fogo por baixo a fim de que, lentamente, dando gritos e em tormentos infinitos, rendessem o espírito ao criador.
Eu vi as coisas acima referidas e um número infinito de outras; e pois que os que podiam fugir ocultavam-se nas montanhas a fim de escapar a esses homens desumanos, despojados de qualquer piedade, ensinavam cães a fazer em pedaços um índio a primeira vista. Esses cães faziam grandes matanças e como por vezes os índios matavam algum, os espanhóis fizeram uma lei entre eles, segundo a qual por um espanhol morto faziam morrer cem índios.(Brevíssima relação da destruição das Índias, Frei Bartolomé de las Casas, 1552)